Cotidiano

Turismo de experiências no Brasil vai de aula de funk no Arpoador à ‘noite da moqueca baiana’

Somente em uma plataforma na internet são 1.100 experiências disponíveis. Especialista em turismo diz que nicho deve crescer porque atinge quem busca criar conexões e memórias, e não só vivenciar um destino. A guia de turismo Vanessa Vieira na Rocinha, no Rio de Janeiro: ela leva turistas para um tour pelas vielas da favela
Acervo pessoal
Que tal um tour de três horas pela favela da Rocinha? E um passeio fotográfico pela Avenida Paulista? Ou uma aula de samba e funk ao pôr do sol do Arpoador? São algumas das opções que o turismo de experiências proporciona ao viajante brasileiro ou estrangeiro pelo país.
Somente no Airbnb – uma da plataformas que reúnem opções – são 1.100 experiências. E a tendência é aumentar. A professora mestre Ádiler Caroline Vilkas, do curso de turismo da Universidade Annhembi Morumbi, explica que esse tipo de turismo interessa a um viajante que não vê o destino em si como o foco principal.
“É para quem busca vivenciar a cultura local, aprender na prática e se sentir parte da comunidade. Mais do que conhecer lugares, o objetivo é criar conexões e memórias.”, analisa.
“Claro que, além da questão preço, por trás existe também o valor que a experiência proporciona a quem vivencia, que geralmente é o mais importante para quem busca esta modalidade”, continua.
Segundo Ádiler, as experiências também têm ligação com a exclusividade. “É como ter uma viagem personalizada conforme o perfil de cada turista ou de um pequeno grupo que viaja junto – muito comum nessa modalidade”, completa.
A gerente de marketing do Airbnb, Sarah Galvão, conta que experiências como essas já somam 40 mil pelo mundo, somente na plataforma. No Brasil, o site Tripadvisor também reúne opções.
“Há uma expectativa de crescimento. Quando alguém reserva uma hospedagem na nossa plataforma, já comunicamos que existem possibilidades de experiências para aquela localidade”, diz.
Houve um crescimento considerável de buscas por experiências, conta Sarah, quando o Airbnb e a ONG Migraflix lançaram o projeto Raízes na Cidade, com objetivo de proporcionar criadas por refugiados e imigrantes.
Para manter a procura pelos serviços oferecidos, há encontros sendo feitos entre a equipe de experiências da plataforma com os anfitriões para dar dicas de como aprimorar a proposta e melhorar o momento oferecido ao turista. “No geral, há muito interesse por culinária. Turistas querem descobrir novos sabores”, completa.
A psicóloga Patricia Castaing recebe turistas em sua casa, na Lagoa, no Rio de Janeiro, para uma noite de moqueca baiana e caipirinha
Acervo pessoal
Da culinária ao funk
Foi de olho nesse filão que a psicóloga Patricia Castaing decidiu abrir as portas de sua casa, na Lagoa, bairro da Zona Sul do Rio de Janeiro, para uma experiência que incluir cozinhar uma moqueca de peixe para turistas.
“Sempre gostei de cozinhar, chamar amigos para jantar aqui em casa, experimentar receitas novas. Já sabia das experiências há algum tempo mas só agora me vi com disponibilidade de tempo para começar”. E assim já atraiu franceses e americanos para uma aula de culinária com direito a azeite de dendê, pimentão, coentro e pimenta.
A experiência custa R$ 180 por pessoa e ainda inclui aprender a fazer e a beber uma caipirinha de limão ao som de MPB, no entardecer com vista para a Lagoa Rodrigo de Freitas e o Corcovado. Ainda tem vinho e sobremesa com fruta da estação.
“Eles podem ir comer uma moqueca em qualquer restaurante mas não saberão como é feita. Quem opta por esse tipo de experiência são pessoas mais curiosas, descoladas, que buscam não somente o que é dado para o turista tradicional”, conta.
Um turista francês descreveu a experiência como mais “calorosa”. Uma carioca que comprou a experiência para levar amigos de outros estados disse que a noite proporcionou um Rio “de um ângulo diferente.”
Já a dançarina Maria Eduarda Lima cobra R$ 120 por uma experiência que inclui samba e funk durante o pôr do sol do Arpoador, no bairro de Ipanema, também numa região nobre do Rio de Janeiro.
“Os participantes ainda podem beber uma caipirinha e depois curtir uma festa em Ipanema e mostrar, no palco da balada, o que aprenderem na aula”, conta ela, que também leva a experiência para a favela da Rocinha, na zona oeste da cidade.
“Lá, já dei aula para ingleses e espanhóis. Eles vão fazer o tour pela comunidade e no final assistem a uma apresentação de capoeira e samba. E, quem quiser, pode fazer minha aula. Não falo a língua, mas vou me virando. Alguns arriscam, dão uns passos, outros já conhecem”, conta.
Turistas da África do Sul acompanhados de guia na Rocinha: experiência custa R$ 200 por pessoa
Acervo pessoal
Duas horas na Rocinha
É também pela Rocinha que a guia de turismo Vanessa Vieira leva turistas para uma experiência de duas horas pela favela. Tudo começa com um mototáxi até o topo e depois a turma desce pelas vielas da comunidade caminhando.
“Explico sobre a vida na Rocinha, a cultura local, a história. Fazemos cerca de duas paradas em outras lajes. Já recebi turistas do México, Israel, África do Sul, Índia, Argentina, Estados Unidos. Curioso é que, do Brasil, ainda não recebi ninguém. Acho que eles têm medo”, conta.
A experiência custa R$ 200 por pessoa. “Os turistas perguntam porque as favelas estão tão próximas dos bairros nobres, como as pessoas vivem, se trabalham fora das comunidades, como é o saneamento básico, educação e saúde. Eles gostam mais de fotografar as paisagens com a vista lá de cima”.
Experiência no entorno da Av. Paulista reúne grupos para fotografar, buscar novos ângulos e olhares pela metrópole
Acervo pessoal
Av. Paulista com outros olhos
Em São Paulo, o fotógrafo Filipe Morgado organiza desde janeiro de 2019 uma experiência fotográfica pela Avenida Paulista, uma das mais movimentadas do país.
A ideia consiste em reunir grupos de até quatro pessoas para um passeio de quatro horas e que, dependendo do dia da semana, tem um roteiro diferente que pode incluir a Japan House, a Casa das Rosas, o Museu de Arte de São Paulo, o Instituto Moreira Salles e o Conjunto Nacional.
“Começamos com um bate-papo sobre fotografia em uma cafeteria. Conversaremos sobre os significados das fotografias e é um momento para unir o grupo. Depois, caminharemos fotografando pela Paulista com alguns lugares especiais escolhidos durante nosso bate-papo”, conta.
A experiência custa R$ 125 e já reuniu colombianos, franceses, espanhóis, alemães, americanos e coreanos. “Cada pessoa pode levar sua câmera ou eu empresto. Mas pode ir até de celular, independente do seu conhecimento em fotografia. E cada sendo uma surpresa para cada um porque não é um tour convencional”, explica.
“E cada turista reage de um jeito: uns gostam de ficar quietos buscando ângulos e desfrutando do passeio com um novo olhar. Outros já gostam de conversar, compartilhar ideias e pedem até dicas de fotos”.
Uma turista de Rio Claro (SP) disse que “conseguiu o objetivo de levar a Paulista no coração com um novo olhar”.
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redação

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