Cotidiano

À beira da falência, aérea francesa Aigle Azur deixa milhares de brasileiros sem passagem

Todos os voos para o Brasil, Mali e Portugal foram cancelados nesta quinta-feira (5). Aeronave é um Airbus A332 da companhia francesa Aigle Azur
Reprodução/EPTV
A companhia aérea francesa Aigle Azur, que entrou com pedido de recuperação judicial, suspendeu desde o início da semana dezenas de voos por falta de recursos para garantir o serviço. Pegos de surpresa, milhares de brasileiros que haviam comprado passagem ficaram sem o bilhete – e muitos deles não receberam, até o momento, o reembolso do valor pago.
Todos os voos para o Brasil (Campinas-Viracopos), Mali e Portugal foram cancelados subitamente nesta quinta-feira (5), “diante dos imperativos de segurança”, afirma um comunicado divulgado nesta manhã. Os trajetos à Ucrânia e Argélia, principal rota da companhia, estão bastante afetados. Todas as vendas de passagens a partir de 10 de setembro foram suspensas.
De acordo com o procedimento de recuperação, enquadrado pela justiça comercial francesa, a empresa tem o prazo até segunda-feira (9) para conseguir um comprador e evitar a falência. 
“Está cheio de gente na frente, mas está tudo fechado. Nos telefones, ninguém atende, nem em francês, nem em inglês, nem em português”, afirma a estudante Thaís Diniz Oliveira, que se deslocou até a loja da Aigle Azur em Paris nesta manhã em busca de uma resposta, mas encontrou as portas fechadas e vários clientes indignados. “Chamaram a polícia e os policiais disseram que não podiam fazer nada por enquanto. É inacreditável”, comenta a paulista, que sequer havia recebido uma mensagem de cancelamento dos bilhetes comprados pela mãe e o irmão.
Os dois viriam a Paris visitá-la pela primeira vez, na semana que vem. A família está de passagens compradas para passear em Barcelona, mas não sabe se será possível concretizar a viagem.
Festa de aniversário ameaçada
Já a engenheira de telecomunicações Mariela Mariano ficou sabendo menos de 48 horas antes do voo que pode não conseguir ir ao Brasil para comemorar o seu aniversário de 26 anos com a família e os amigos. Para comprar novas passagens, ela terá de pagar mais que o dobro do valor que havia gasto com a Aigle Azur, por cerca de €400 (R$ 1,8 mil).
Entardecer no Aeroporto de Viracopos, em Campinas, onde pousariam voos da aérea francesa
Reprodução/EPTV
“Está tudo organizado para a festa, e agora eles cancelam de última hora. Estou a ver navios, ninguém me deu nenhuma informação”, critica a engenheira, que mora na França desde 2016. A última vez que visitou a família no Brasil foi há um ano. Mariela tentou contato telefônico com a companhia, mas depois de meia hora de espera, a ligação, paga por minuto, caiu. “Está um caos”, frisa.
Bárbara Pocciotti, que tinha três voos marcados com a companhia, recebeu os cancelamentos a conta-gotas. O prejuízo por ter de adquirir novas passagens de última hora e em trechos simples já passa de € 800 (R$ 3,6 mil). “Por sorte, eu tenho uma reserva financeira que me permite comprar, mas imagine quem não tem? Já passei por isso, logo que vim morar na França. Quando você tem o dinheiro contado e cancelam uma passagem assim, acabou: você não vai mais”, diz a profissional do turismo. “É muita sacanagem! E o pior é que você não tem nem a quem recorrer, porque a companhia pode cancelar o voo com apenas 14 dias de antecedência, sem que aconteça nada.”
Checar antes de comprar
Os problemas com a saúde financeira da Aigle Azur abalaram a sonhada viagem de cinco amigas a Paris. A especialista em logística Taciana Macedo Mendes mora na capital francesa há 13 anos e se preparava para receber o grupo do Brasil em outubro, mas o cancelamento das passagens levou uma delas a anular a viagem. Com o euro nas alturas em relação ao real, os preços das novas passagens extrapolariam o orçamento.
O consolo foi não ter tido contratempos com o reembolso das passagens. Tatiana buscou ajuda de um colega advogado para escrever uma carta para a companhia, e o dinheiro foi devolvido em dois dias.
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“A lição agora é sempre checar sobre a situação de uma empresa, antes de comprar coisa de valor alto”, resume Taciana.
O consulado brasileiro em Paris está sendo procurado por cidadãos preocupados com as viagens marcadas, inclusive turistas que estão na França e, agora não têm mais passagem de volta para o Brasil. “A Direção Geral da Aviação Civil francesa (“Direction Générale de l’Aviation Civile”) informa que no momento não há definição sobre o tratamento reservado aos litígios”, diz uma nota publicada pela diplomacia em seu site. “O consulado-geral sugere aos passageiros titulares de passagens aéreas da companhia Aigle Azur que obtenham informações junto às agências de viagem onde adquiriram suas passagens aéreas ou, caso tenham adquirido as passagens com cartão de crédito, junto ao respectivo serviço bancário”, completa o texto.
Voos transatlânticos low-cost: aposta arriscada
Os problemas financeiros da companhia aérea já se arrastam desde o início do ano e levaram até à devolução de alguns aviões. A escalada de desentendimentos entre acionistas resultou na “desconfiança e deterioração do clima social” na Aigle Azur, e motivou agora o pedido de insolvência, admitiu a companhia num comunicado interno, divulgado pela imprensa francesa.
A empresa é uma das mais antigas da França: fundada em 1946, transportou quase dois milhões de passageiros em 2018, com faturamento de € 300 milhões no período. O que a levou à beira da falência em tão pouco tempo foi a aposta nos voos low-cost, inclusive nos trajetos transatlânticos, como ao Brasil. “Passamos a fazer Paris-Berlim por € 30, mas o nosso modelo econômico era baseado em tarifas de € 300 para ir para a Argélia”, revelou um piloto ao jornal Libération.
Outra companhia europeia, a Norwegian, passa por problemas semelhantes. A Air France chegou a se seduzir pelo desafio, com a Joon – que fechou apenas um ano depois de iniciar o serviço a baixo custo, que fazia o trajeto Paris-Fortaleza.
A Aigle Azur tem 11 aviões e 1.150 funcionários, que acompanham com apreensão o desenrolar dos acontecimentos. Na quarta-feira (4), o diretor-presidente Frantz Yvelin pediu demissão.  
O futuro da empresa agora depende das ofertas que a companhia pode receber nos próximos quatro dias. Há diversos compradores potenciais, como Gérard Houa, um acionista minoritário, a Air France ou ainda Lionel Guérin e Philippe Micouleau, ex-dirigentes da Air France.
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redação

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